terça-feira, 9 de novembro de 2010
obrigada!
Seu nome é Norma. Em uma conversa com minha filha, dia desses, citei seu nome e fiquei com uma saudade gostosa remoendo minha cabeça, pensando em falar alguma coisa sobre minha amiga.
Quando eu tinha 14 anos, quase 15, conheci a Norma, ela então com 30 anos. Meu pai, através de amigos de trabalho havia conseguido me colocar em uma grande emprêsa de Osasco, como auxiliar de secretária.
A secretária do Departamento era ela, e eu fazia os serviços rotineiros de datilografia, arquivo, cópias....
De principio achei que a diferença de idade e a situação dela na emprêsa, jamais permitiria que fôssemos amigas. Na verdade, fiquei apavorada, porque eu era uma adolescente sem experiência alguma, nem de vida e muito menos profissional.
Já a Norma era uma mulher madura, ao menos eu a via assim, e seu comportamento deixava transparecer que eu estava certa. Comedida nas palavras, vestia-se sempre com elegância, saias justas, saltos altos, cabelo curto e bem penteado. Hoje, quando vejo Marilia Gabriela na tv, lembro-me dela, têm o mesmo tipo, menos a voz.
Meus temores logo foram embora. Fui acolhida como um mascote do departamento. Todos eram gentis e carinhosos, mas ela foi além, foi amiga, quase mãe. Como leitora fanática resolveu que devia me apresentar à literatura, devagar, emprestando-me livros (sem que eu pedisse) de José de Alencar, depois Casemiro de Abreu, depois Graciliano Ramos, e quando eu menos esperava, vieram os autores internacinais como Cronin, Pearl Book, Hemingway, Charles Dickens, e por aí afora.
Mas tudo era muito sutil, numa conversa qualquer ela perguntava:-já leu fulano? quando a resposta era negativa, lá vinha ela com um livro para me emprestar.
E durante meu período de leitura, ela perguntava sempre - casualmente - em que parte do livro você esta?
Diante de minha resposta fazia perguntas e comentários para que eu entendesse melhor o livro. Pouco tempo depois eu já estava apaixonada pela leitura, a ponto de não conseguir ficar sem um livro nas mãos.
Lembro-me dela falando ao telefone, sempre rodando um brinco na orelha, cadeira afastada da mesa, voz baixa e conciliadora. Solteira convicta, duas faculdades, vários namorados mas nenhum tão interessante a ponto de leva-la ao altar. Suas férias, invariavelmente, eram passadas em Parati. Eram tantas fotos, tantas historias engraçadas e divertidas, a ponto de passar para mim o carinho que ate´hoje tenho por aquela cidade linda. Só fui conhecer Parati depois de muitos anos, com minha familia, e entendi porque ela gostava tanto dali.
Alguns anos depois, talvez uns cinco, ela foi convidada a trabalhar em um famoso laboratório alemão, lingua que dominava, assim como o inglês, e foi um convite irrecusável. Lá se foi minha amiga, deixando-nos - a todos do departamento - meio órfãos e muito tristes.
Nossa amizade nunca saiu das paredes da emprêsa. Nunca fomos a uma festa, jantar ou cinema. Nossas vidas eram totalmente diferentes, os amigos e amigas dela eram pessoas mais velhas e bem mais interessantes que meus amigos.
Perdemos o contato alguns anos depois, quando me casei e fui cuidar de minha familia. Até o último cartão que me mandou ainda estava solteira, feliz, fazendo tricô - fazia blusas lindas de lã - para presentear o atual namorado.
Lembro-me dela rindo e dizendo: - eles ficam comigo até a blusa ficar pronta. Depois somem...
E eu dizia :- você é boba, já que sabe disso porque não tricota e desmancha...tricota e desmancha...
Oxalá toda menina sem mãe tivesse uma amiga como eu tive. Gostaria de encontra-la hoje para dizer tudo isso pessoalmente. Qualquer hora tento achá-la no Google, quem sabe? lembrará de mim? estará bem?
Sei que parte da pessoa que sou hoje, devo a ela, e essa é a mágica. Ela nunca me disse "vou ensinar uma coisa para você". Ela ensinava sem que eu percebesse, sem me chatear, me respeitando.
É claro que hoje meu brinde com cerveja geladíssima será para ela.
Obrigada querida por ter suportado minhas chatices de adolescente, meus papos furados sobre rock, Elvis, Beatles, paqueras, briguei com o namorado... voltei com o namorado...
Quem sabe um dia ainda nos veremos e vamos rir muito daquele tempo delicioso, quando aprendi o valor de uma amizade sincera e desinteressada, pois de mim você pouco esperava, nem mesmo esse agradecimento tardio. Saudade...
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Quem sabe alguém que a conheça conta sobre sua postagem?
ResponderExcluirEu lembro dela em uma foto junto com vc e com outra moça.
bjsss
Oi Ivani...Vc fala tanto das pessoas que participaram de sua vida que da até inveja...Mas sabe se eu tivesse um blog escreveria sobre vc... Não esqueço seu café da tarde, seu bolo de chocolate,a forma calorosa que me recebia em sua casa quando ainda eu era apenas um namorinho, lembro da vespera do casamento quando cheguei no mercadinho chorando por causa da festa, e logo vc deu um jeito...É Ivani... como não tenho um blog escrevo no seu kkkkkkkk. Vc também é merecida de homenagens, caráter esse formado por essas histórias lindas, e pessoas que desenharam seu caminho. um beijo
ResponderExcluirLarissa, é outra foto, eu não estou nela. Pena que nunca tiramos uma foto juntas.
ResponderExcluirPaula, obrigada pelas palavras boas, mas eu acredito que todos temos historias lindas para contar, é só puxar pela memória. E nunca estivemos sós, sempre houve alguém que marcou.
Quanto ao café com bolo, é só chegar que a gente dá um jeito, rapidinho.
pode usar meu blog à vontade, contanto que não fale mal de mim rsrsrsrsrsrs!
beijos
Já ouvi estórias (é assim que se escreve?) da Norma...e sempre a imaginei muito elegante e amiga!
ResponderExcluirSempre gostei de ouvir essas estórias, parece que faço parte delas...
Adorei a parte do tricô! Achei ótima a sua idéia do artifício de tricotar e desmanchar...
Conte sempre as suas lembranças...Adoro!
Beijinho
Como é bom ter amigos... são inesquecíveis mesmo...foi voce que me despertou o gosto pela leitura, lembra?
ResponderExcluirIvani acontece uma coisa muito interessante quando leio seus textos, faz com que eu recorde minha própria história, não só a de família (que esta sempre viva) mas toda a história, com amigos, namorados,filhos, escola, trabalho, tudo... que bom né?
Seu blog esta fazendo muito bem a todos...
Aposto que a Norma aprendeu muito com voce tambem...
Beijos