Quem o vê ali, frente ao mar, olhando com prazer o vai-e-vem das ondas, deixando-se levar pela placidez do horário, nem repara na pele queimada, nos cabelos secos de sol.
Vez ou outra suspira longamente, e sente o ar fresco e úmido entrando por suas narinas, renovando-lhe as energias.
Não é mais jovem, mas também não é ainda um velho, muito velho. É um homem forte, que faz longas caminhadas pela praia, que prefere as manhãs para andar e as tardes para apreciar seu mar.
Eu sei sua historia, e poderia explora-la, colocar aqui um melodrama. Mas não, é uma historia comum, mas com um recado de força, de determinação. Muitos homens tiveram suas vidas mudadas, algumas radicalmente. Porém poucos, como ele, tiveram a dignidade de sair de cena, fechar a cortina.
Casado, filhos cursando faculdade, trabalhando, namorando. A vida, tanto profissional, como familiar, diante de uma encruzilhada.
Não, os filhos não preocupavam mais. A mulher tornara-se uma inimiga. Infeliz, amarga, e completamente desmotivada. Com os filhos alçando voo ela sentia-se inutil, a o agredia por ter perdido anos e anos cuidando deles. Anos perdidos dizia ela no auge da revolta.
Não houve diálogos, não eram possíveis. Apenas agressoes verbais e cobranças. Muitas noites insones ao lado daquela mulher que um dia ele amara tanto...
Tornou-se impossivel a convivência, insuportável voltar para casa, deplorável olhar para o rosto endurecido que já fora tão bonito. Ela já não o amava, nem permitia que ele a amasse.
Não viveria mais esse martirio, não ele, e nem a magoaria mais com sua presença.
Foi simples. Aposentadoria resolvida, imóveis transferidos para ela. Caberia àquela mulher destruida, uma boa renda de aluguel.
Ele ficou apenas com a pequena e simples casinha na praia. A renda que recebia por todos os anos de trabalho eram suficientes para que vivesse honradamente, com simplicidade e paz.
E ali está ele...olhando para o mar em sua tarde morna, o rosto moreno, o coração em harmonia.
O retrato de um homem na sua mais absoluta solidão, mas sereno ... e quem sabe feliz?!?