quarta-feira, 16 de maio de 2012

Placidamente. . .





Quando os pássaros iniciavam a algazarra da alvorada e o sol aparecia tímido acima da planície, ele já estava trabalhando na lavoura.
A grande usina de açúcar e alcool, com seus fornos e caldeiras enormes e vorazes, consumiam tanta cana quanto era possível colher.
Tarefa penosa, costas curvadas, facão na mão. Os filhos mais velhos - mas ainda crianças - estavam ao seu lado, resignados.
Assumia também outra função na fazenda. Ia a cavalo, em dias alternados, até a cidade para buscar o correio, comprar remédios, levar documentos ao cartório.  Tudo o que o patrão ordenasse.
Quando as industrias têxteis se instalaram na cidade próxima,  os filhos começaram a emigrar. Ele não viveria sem os filhos, sem o barulho deles, sendo pai amoroso e companheiro.
Mudou-se então o homem para a cidade, trabalhar em uma olaria com direito a casa e salário.
Deixou para trás apenas as lembranças e uma lápide sobre a sepultura da filha caçula, morta na adolescência,  de uma breve doença.
A mulher, companheira sempre alegre, mudara muito. Andava pensativa, lembrava-se da filha, sentia-se doente.  Poucos anos depois e o destino - cruel e injusto - haveria de acrescentar mais uma dor em sua historia.  Perderia  mais um filho, jovem,  bonito, cabelos ruivos como ela,  sardas no nariz.
Ela desmoronou. Eram insônias, visões, desânimos. Houve o diagnóstico de depressão, e depois de longo tempo de melhoras e recaídas, o encaminhamento para hospital psiquiátrico.

Naquela manhã de julho o homem sentou-se ao lado dela no assento traseiro do carro de aluguel. À frente o motorista e um primo sempre presente.
Ela apática olhando a paisagem. Ele triste, muito triste.
Era longe, quando chegaram foi tudo muito rápido. Papéis, documentos, malas.
Despedidas e acenos ausentes por parte dela, mas dolorosos e intermináveis da parte dele.

O primo sugere então: - tem um bar aqui em frente, vamos tomar um guaraná antes de voltarmos.
Sentaram-se à mesa,  a mesma mesa que minutos depois sustentaria o homem morto, fulminado por um infarto que colocou um fim naquela tristeza do tamanho do mundo.

Essa é a historia de meu avô Plácido, pai de papai, que morreu aos 54 anos, de tristeza.

Lembro-me dele sorrindo, feliz e brincalhão, porque não estava por perto nesses momentos de dor.
Não pretendia escrever um texto triste, mas foi impossivel, porque por mais alegre que tenha sido a trajetória, o fim deixou a familia chocada.
Esses fatos são lembranças fragmentadas e conversas que ouvi de meus familiares.
Meu avô era carinhoso com as noras e genros e amigo dos filhos como poucos foram em sua época.
Para ele meu respeito e minha saudade.

18 comentários:

  1. Noossa,Ivani!!! Que história triste,sofrida, mas bem da vida desse homem que, de saudades dos filhos, foi se apagando até o último suspiro.

    E fiquei curiosa com o que aconteceu com ela.Ficou por lá na clínica?

    Tu sabes, escreves muito bem. Dá vontade de ler mais e mais,fica o gostinho de quero mais!! Muito legal, mesmo triste! Fazer o que. Fica saudade e lembranças!

    beijos,chica

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  2. Minha querida,

    Não pude deixar de me emocionar ao ler a história de seu avô...que pessoa linda!E naquele tempo se morria de amor...tive uma prima(também sei de ouvir contar)que perdeu o noivo e desde então passou a ficar todas as noites na porta da casa,sem agasalho,fizesse o frio que fosse,até adoecer.Morreu de pneumonia e todos falavam que morreu de amor...
    Mas no caso de seu avô,foi o coração que não aguentou a tristeza,já que morreu no dia em que a esposa foi internada.
    Você escreve tão bonito,com tanta emoção que nos faz ver as cenas,como se fosse um filme...e realmente, seus contos dariam belos filmes ou seriados da TV.
    Que bom que gostou da continuação das Memórias,amiga.Fico feliz.
    Bjsssss,Ivani,e um perfume de jasmim,
    Leninha

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  3. Ivani quanta intensidade na vida destas pessoas, quanta tristeza.
    Às vezes não queremos escrever coisas tristes, mas elas existem porque fazem parte do viver.
    A parte mais bela fica por conta da tua escrita e o carinho por este belo homem, teu avô.
    Beijo

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  4. Como é bom ler seus textos!
    Vivenciei as cenas e emocionei-me.
    Abraços amiga! Boa noite e um amanhã
    abençoado pra ti.

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  5. PUXA, QUE DÓ!!! O QUE O MUNDO FAZ PARA ALGUMAS PESSOAS, NÃO É?? FIQUEI MUUUITO TRISSSTE, IVANI. PODIA TER SIDO TÃO DIFERENTE; SEU AVÔ SE FOI MUUITO NOVO...

    BEIJOSSSSSSSSSSS

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  6. EI MINHA AMIGA QUERIDA!
    MUITOS FATOS TRISTE ENFRENTASTE TEU AVÔ, SEI UM POUCO O QUE ELE SENTIU EM PERDER OS FILHOS, POIS MINHA MÃE PERDEU DOIS, E ELA ENTRISTECEU PROFUNDAMENTE, SEI QUE CARREGA DENTRO DELA ESTA DOR. SIM A TRISTEZA NOS MATA, NOS DEFINHA. QUE PENA ACONTECER ISSO COM SEU VÔ.
    FICASTE COM AS LEMBRANÇAS ALEGRES, QUE BOM, ASSIM SERÁ ESTA IMAGEM QUE CARREGARÁS CONTIGO.
    UM BEIJO ENORME! SAUDADE DE TU!!!!!!!!!!

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  7. Uma história de amor e tristeza.
    Rubem Alves disse que "a alma é uma borboleta. Há um instante em que uma voz nos diz que chegou o momento de uma grande metamorfose", a dele foi rápida, após ver várias outras injustas, mas toda essa história há de ter deixado ensinamentos pelo caminho, deve ele e sua senhora e seus filhos que se foram tão cedo, ter cumprido suas missões por aqui.
    Nós, por exemplo, tão distantes dele, através de você soubemos agora dessa história e ela disse algo a cada um de nós, ensinou valores, emocionou.
    Salve Sr. Plácido!
    Salve você Ivani!

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  8. Ivania, é uma história triste contada com a leveza e doçura que apenas a tua voz possui.
    Beijo

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  9. Que histórias de vida vc nos trás!!! E que emocionante, ao mesmo tempo que triste...mas uma lição!
    Adoro suas visitas e suas palavras...obrigada Ivani!
    Bjs e uma ótima quinta-feira, com paz no coração...é o que desejo!
    CamomilaRosa

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  10. Oi queridinha

    Não me lembro muito bem da fisionomia dele, mas lembro da olaria. Um dia a avó Albina me chamou e disse: "ERSSO, SEU AVÔ ESTA EM UM LUGAR MUITO BONITO, ELE SEMPRE VEM FALAR COMIGO" desse dia em diante, por várias vezes eu presenciei a conversa dela, você sabe do que eu estou falando....Adorei sua postagem, Beijos .....ERSSO.

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  11. ivani a vida nem sempre è alegre,as vezes a sorte abandona uma pessoa completamente,sem que podemos saber o porque.
    è difícil sobreviver a um grande amor !!!
    aqui na Itália se diz que as pessoa maravilhosas viverão pra sempre no coração e na memoria dos que ficam,porque nós faremos conhecer a nossos filhos,e nossos filhos ao seus filhos.

    baci

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  12. Nossa....

    Eu não conhecia essa história....

    Beijos

    Eliana

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  13. Jesus, que sofrimento!!! Morrer de tristeza imagino ser muito difícil.
    Bjs querida.

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  14. é uma história triste mas que contem muito amor.
    Eu nunca conheci os meus avôs, só as avós, e sei que a vida deles foi tambem dificil, nada comparada com os dias de hoje...
    Adoro a tua escrita já o disse.
    Beijos
    Pinta

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    1. TRISTE NÃO É IVANI MAS PELO QUE LI ELE ERA UMA HOMEM DE HONRA ..INFELISMENTE A TRISTEZA FAZ ISSO .FAZ COM QUE MORREMOS AOS POUCOS .
      UMA VIDA COM TANTO SOFRIMENTO E TANTA TRSITEZA E UM FINAL TAMBEM TRISTE
      QUE ELE HOJE ESTEJA BEM AO LADO DOS SEUS LA EM ALGUM LUGAR QUE ACREDITO EU SEJA MELHOR QUE AQUI UM LUGAR DE TANTA TRSITEZAS NÃO É?
      NÃO TIVE COMO NÃO ME EMOCIONAR ..
      BEIJOS

      OTILIA LINS

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  15. Minha querida Ivani, a estória de sua família é repleta de amor, mas também de muita dor, será que é por isso que você consegue, através de sua escrita, tocar no coração de todos que têm o prazer de ler o que você escreve?
    A vida antes, no tempo de nossos antepassados + próximos era muito difícil e sofrida. Seu avô morreu tão joven aos 54 anos e já tinha netos.
    Se meu pai estivesse vivo hoje seria seu aniversário, ele morreu aos 67 anos; e ontem foi o aniversário da morte do primeiro irmão q perdi.
    A vida é triste, a vida muitas vezes é injusta, por isso admiro você, que com uma estória de vida com tantas perdas ainda consegue tocar o coração das pessoas.
    Obrigada minha amiga.

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  16. A ele todo o meu respeito também.
    História triste, porém, infelizmente, real.
    Este é um dos meus piores pânicos, perder pessoas que estimo. Acredito que seja uma das piores, senão a pior dor que um ser humano tenha que passar e infelizmente, ela, a morte, faz parte da vida. Costuma-se apenas ficarmos chocados quando acontece com pessoas ainda novas, como seu avô, e de forma trágica.
    A tristeza pode matar, poucos levam isto em consideração. Creio que a história da esposa será em outro post.

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