Quando depositou a mala nas pedras frias e bastante gastas da velha estação, um suspiro profundo chegou até a garganta.
Mas ela o engoliu.
Havia jurado, para si mesma, que tudo seria sem lágrimas nem dramas.
O dia mal havia clareado, muito cedo ainda, e naquelas horas de pouca luz uma brisa soprava suave, geladinha.O horario ideal para uma despedida.
Esses primeiros raios da manhã lembravam sua infãncia, quando descia a rua de terra batida da casa dos pais para ir á escola. Lá embaixo, na planície, caminhava rápido para não se atrasar, passava pela casa da amiga Martha, e iam tagarelando até às margens do riacho que passava ao lado do predio de madeira.
Quanta coisa linda aprendeu naquela escola. Inclusive aprendeu, aos dez anos, que a vida podia ser muito mais dura com uma criança do que supunham suas amigas.
Mas sobreviveu, e agora partia. Uma estranha sensação de impotência chegou a deixa-la deprimida por um minuto, talvez nem tanto.
Olhou em volta, sorriu levemente, como Monalisa, aquele sorriso de enigma, mas de poder.
Sim, ela estava indo embora. Trocou de emprego, trocou de roupa, e de enderêço.
Colocou as poucas coisas que realmente valiam a pena na velha mala dos pais e saiu bem devagar da casa que havia sido um lar, um dia.
Voltaria, quem sabe, para matar a saudade. Olha só essa palavra boba já começando a incomodar...
Ao longe o barulho de rodas de ferro deslizando pelos trilhos brilhantes. Um ultimo olhar em volta, algumas pessoas haviam chegado, silenciosamente, nem notara.
O trem apita na ultima curva antes de surgir, imponente, dono de seu destino, e do dela.
Meninas pobres são assim, valentes e lindas. Ela não tinha medo, era valente e linda, como num filme, como num sonho.